Sanções

Opinião de Maria do Céu Patrão Neves

maria_do_ceu_patrao_nevesA notícia saiu esta semana: o Conselho de Ministros das Finanças da União Europeia (Ecofin) decidiu aplicar sanções a Portugal e Espanha por deficit excessivo em 2015, isto é, por terem ultrapassado a meta dos 3% inscrita no Pacto de Estabilidade e Crescimento.

Esta regra já foi quebrada mais de 100 vezes e é do conhecimento comum que a França é o Estado-membro que mais vezes infringiu a meta do deficit, 11 vezes. Portugal, Grécia e Polónia infringiram-na 10 vezes, o Reino Unido 9 vezes, e a Alemanha 5 vezes, para além de muitos outros Estados-membros que engrossam esta lista.

As questões são mais que muitas perante esta inusitada estreia de aplicação de sanções aos prevaricadores da meta dos 3%. Se a norma existe e houve um compromisso dos Estados-membros em relação ao seu cumprimento, porque é que a primeira violação não foi de imediato punida? Seria então obviamente justo. Uma vez que nem à primeira, nem mesmo à centésima infracção houve qualquer sanção, a norma não perdeu necessariamente credibilidade, tendo-se tornado apenas num desiderato, num ideal? Assim sendo, qual a legitimidade para a activar? E porquê activá-la agora? Porque são apenas Portugal e Espanha os atingidos? Não vejo outra justificação…, mas este não será certamente um “incentivo” como o Ministro alemão das Finanças sarcasticamente afirmou.

Com efeito, a única resposta plausível para a decisão do Ecofin é a da desconfiança que a persistente ausência de governo em Espanha e a tradicional gestão despesista de esquerda em Portugal suscitam. Sobra, no mínimo, uma dupla discriminação em relação a estes países: porque são os únicos a serem penalizados (ou receberem o privilégio dos incentivos de Schäuble) e porque o são em função da sua realidade nacional.

Colocando de parte a questão, não despiciente, do passado e das responsabilidades do deficit excessivo de 2015, colocando mesmo de parte a questão, fundamental, do presente e da legitimidade moral (que não legal) de avançar com as sanções, viro-me agora para o futuro para os próximos dias que os governos têm disponíveis para contestar a decisão e para o 1 de Agosto em que o valor da multa é decidido. A mensagem tranquilizadora de que a sanção pode efectivamente ser nula parece-me no mínimo ridícula, não obstante políticos, comentadores, fazedores de opinião, jornalistas, economistas…o irem avançando como a melhor solução. Será, sem dúvida, a melhor do ponto de vista político imediato uma vez que a Comissão Europeia poderá argumentar que finalmente cumpriu o Pacto sem ter o ónus da revolta dos Estados e das populações. Mas não a médio ou longo prazo. O que na verdade se verificará é o prolongar da displicência, do relaxamento, do procedimento anterior que afirma e reitera que o Pacto não é para levar a sério.

Também pode acontecer uma decisão de sanções efectivas e até podem ser decretadas apenas em relação a um país e não aos dois, sobretudo se um deles apresentar, nestes próximos dias que lhes são dados, medidas para controlo do deficit, como se verifica com a Espanha. Os nossos vizinhos, poucas horas depois da decisão do Ecofin, já anunciavam medidas complementares para redução do deficit, tentando furtar-se às sanções. A consequência, entretanto, é Portugal ficar teimosamente só, continuando a garantir que não proporá qualquer medida adicional e continuando a apostar nos argumentos anteriores que, obviamente, fracassaram.

Sem reconhecer legitimidade à Comissão Europeia para decidir agora implementar o Pacto de Estabilidade e Crescimento, acuso esta teimosia do governo português em nada fazer (não há plano B!), de dar razão às desconfianças europeias sobre um futuro controlo do deficit no nosso país.

 

Link permanente para este artigo: https://maiscentral.com.pt/sancoes/