E assim chega ao fim mais um ano letivo e o início das férias de verão.
Por esta altura, o núcleo duro divide-se. O mais velho, à medida que se começa a aproximar o fim das tarefas escolares, começa a entrar num estado de euforia difícil de controlar, qual revolução dos cravos ou grito de liberdade! A ilha do Pico espera-o e ao contrário dos anos anteriores, com a mudança de toda a família para o Faial, este ano a distância representa apenas 30 minutos a bordo do “Mestre Simão”, o que facilita bastante a gestão das saudades. O relógio ficou atrás e deixou de fazer sentido, o despertador já foi recusado e eliminado o modo automático, a mochila que durante meses se ocupou da árdua tarefa de transportar livros, cadernos, réguas, cadernetas, acrescida pontualmente do peso bruto da responsabilidade da sua avaliação, nos próximos meses passará apenas a transportar a toalha de praia, o protetor solar, o telemóvel e a coluna da moda, que não se cansa de dar voz aos famosos youtubers, que vão aumentando a sua popularidade na mesma proporção da sua estupidez, a que eu sou, involuntária e insistentemente, obrigada a assistir. A mais nova, ainda tem pela frente mais uma semana até acabar o seu primeiro ano escolar. Não houve um único dia que não entrasse no carro ao final do dia, dizendo o quanto estava “escalfada” que, traduzido para o dicionário corrente, daria qualquer coisa como esfalfada ou extremamente cansada. A ela, com apenas 6 anos, esta necessidade de ter de passar uma grande parte das férias longe dos pais, ainda lhe causa alguma apreensão. Prefere dividir-se entre a avó e o padrinho de S. Miguel e só em último recurso rumar à ilha do Pico. Ao contrário do irmão, estar em casa é coisa que não lhe faz qualquer confusão. Gosta do seu canto, tal como a mãe.
A rotina dos últimos meses entra assim em hibernação, com a promessa de voltar só lá para meados do mês de setembro. Nos primeiros dias tudo me soa a estranho. O carro continua a sair do trabalho em direção à escola, o silêncio que tantas vezes desejei ao longo do ano, chega agora com sabor a vazio, a incómodo, em diversos momentos até a amargo. Rapidamente me dou conta, de ter deixado algures num bocado de terra cercada por mar, grande parte de mim. Por estes dias começo a contar no calendário os dias de trabalho que me faltam para chegar às férias, sendo que este ano elas vêm carregadas de visitas, sem grande folga para o derradeiro descanso, mas com a expectativa de bons e intensos momentos. De facto, à medida que os anos passam, os nossos objetivos vão-se alterando tanto na forma como no conteúdo. As nossas prioridades baralham-se, outras vezes invertem-se totalmente, deixando muitas vezes o registo do momento exato de viragem. Este ano foi pródigo nestes momentos, especialmente quando confrontada com a fragilidade daqueles que, pela lei natural das coisas, sempre foram o meu porto seguro. Talvez também por isso, coisas tão comuns como a partilha, a companhia, o reencontro, a presença, o diálogo, a amizade, o afeto, mesmo que traduzidos apenas num momento, sejam hoje banalidades que tanto me satisfazem. No presente, ter acordado por mero acaso às 05h30m, ter decidido contemplar o nascer do sol ao mesmo tempo que escrevo este simples conjunto de palavras, foi também apenas um momento, que de tão despretensioso, me deliciou. Venham mais destes!