O modelo de desenvolvimento social tem a sua génese no Mundo Ocidental, com especial expressão na Europa e na América do Norte. Os padrões salariais, de assistência na doença, de pensões e de integração dos mais desfavorecidos são característicos deste pólo transatlântico e conferem-lhe uma dimensão social sem paralelo no resto do globo, mesmo quando pressionados por crises económicas, que põem em causa a sua sustentação financeira. Numa abordagem desprovida de utopias, o apoio social que caracteriza (e ainda bem) este pólo transatlântico requer financiamento exigente que não pode ser descurado.
Do lado Europeu, preocupam-me os constrangimentos ao modelo social que nos distingue do resto do Mundo (não esquecer que representamos apenas 7% da população mundial mas dispendemos mais de 50% de gastos sociais de todo o globo). Os jovens têm vindo a entrar cada vez mais tarde para o mercado de trabalho e, salvo algumas excepções, com remunerações iniciais reduzidas fruto, em muitos casos, da precariedade da sua relação laboral, frequentemente composta por ilusórios estágios que pouco além vão de mecanismos de recurso a mão de obra barata. As suas contribuições sociais são, assim, invariavelmente mais baixas, o que terá efeitos directos na assistência social e de pensões a que têm e virão a ter direito, mas também coloca em causa o próprio regime de providência dos Estados, cada vez mais pressionados pelo envelhecimento demográfico europeu.
Ora, sendo este um cenário que exige a nossa atenção, não podemos descurar os riscos de um possível desvirtuamento da centralidade atlântica. Uma possível ruptura nas relações bilaterais entre a UE e a América do Norte, que consequentemente seria acompanhada pelo reforço económico e comercial com países menos exigentes no que concerne a padrões sociais, poderá ter reflexos perversos no nosso modelo de desenvolvimento, pressionado pela competitividade e predomínio de custos de produção muito baixos, que o são frequentemente à custa de baixos salários e ainda mais reduzidos apoios sociais.
Não convém, pois, descurar a importância das relações transatlânticas como reguladora de um modelo de coesão social. Neste domínio, o acordo compreensivo económico e comercial que formámos com o Canadá e que foi esta semana aprovado no Parlamento Europeu assume uma relevância acrescida, tanto mais que, face às tendências isolacionistas da administração americana, pode não apenas constituir o pólo privilegiado nas relações transatlânticas, como representar um modelo a, no mínimo, considerar na regulação das nossas relações com os Estados Unidos da América.
Salvaguardados os interesses europeus neste acordo (e que abordei, há meses, na minha crónica “CETA – UMA OPORTUNIDADE PERDIDA?”), a aposta no estreitamento das relações com o Canadá deve ser encarada sob o ponto de vista estratégico, na manutenção do pólo transatlântico como modelador das relações bilaterais mundiais, como na defesa dos mais elevados padrões sociais. E se tal centralidade é de importância vital para a Europa, não menos o será para Portugal, em especial para os Açores, em que nos podemos potenciar como interlocutores privilegiados face à nossa posição geo-estratégica e ao nosso enquadramento cultural.