Abstenção — Opinião de Inês Sá

InesEm janeiro do corrente ano, aquando das eleições presidenciais e da já elevada taxa de abstenção registada na Região Autónoma dos Açores, na altura muito próxima dos 70%, fiquei francamente esperançosa que estes valores fossem alvo de uma reflexão mais cuidada, por parte da nossa sociedade, naturalmente com especial enfase nos diversos atores políticos ao serviço da nossa Região.

Se é certo que nos dias que se seguiram, se ouviram alguns comentários sobre este assunto, também é certo que passado um mês, já quase ninguém se lembrava nem das eleições, nem na estrondosa taxa de abstenção. Não fossem as eleições regionais coincidirem neste mesmo ano, o tema da abstenção permaneceria tranquilamente enterrado, ressuscitando apenas quando conveniente, ao serviço de interesses, maioritariamente, partidários.

Comparando de forma muito primária, o número de eleitores considerados nos cadernos eleitorais, com a evolução da população dos Açores com mais de 18 anos, a residir efetivamente nas nossas 9 ilhas, fica claro que a “bota não bate com a perdigota”, tendo inclusivamente esta discrepância sido incluída em quase todos os discursos pós-eleições. Mas este não é um assunto de agora, não é novo, é apenas um facto relevado desde há alguns anos a esta parte, enfaticamente, em período eleitoral. Certamente que grande parte dos atores políticos saberão o motivo pelo qual este assunto permanece por resolver, mas eu, à semelhança de muitos eleitores, permaneço na ignorância ao não conseguir esclarecer as seguintes dúvidas: Qual o motivo que impede a atualização dos Cadernos Eleitorais? Porque ainda não foi feito esse trabalho? É da responsabilidade de quem? Da Republica? Da Administração Interna? Da Região? Aproximar os eleitores da política, despertar os eleitores para a importância da nossa autonomia e o respeito que este legado nos merece, também é isto! É explicarem-nos os motivos subjacentes a esta inflação da taxa de abstenção na R.A.A, cuja consequência lesa a imagem de todos os açorianos, eventualmente de forma extremamente injusta.

Este é apenas um exemplo dos entraves que, muitas vezes, de forma mais ou menos consciente, intervêm na comunicação entre eleitores e eleitos, inviabilizando qualquer participação dos cidadãos, ou até mesmo enviesando a sua conduta.

Um dos erros que mais compromete a comunicação, seja ela qual for, é exatamente o de se partir do princípio de que todos sabem do que falamos, todos sabem as premissas em que assenta determinado assunto, os seus prós e os seus contras, as consequências dos diversos caminhos possíveis, em busca de uma solução. Não sabem, nem têm obrigação de saber! Há quem tenha de facto obrigação é de nos explicar, que mais não seja para que todo e qualquer ruido seja facilmente afastado.

Mas, calma! Não creio de forma alguma que a causa da abstenção tenha como único “bode expiatório” as forças políticas, ou a desatualização dos cadernos eleitorais, acredito também que cada um de nós pode fazer a diferença, combatendo os discursos mais anárquicos que por aí se passeiam. Mas até para isso é fundamental que o diálogo seja claro, que a proximidade deixe de ser um chavão e passe a fazer efetivamente parte do dia-a-dia dos agora eleitos, dentro e fora de portas. Nem sempre conseguirão apresentar com presteza a solução para determinado desabafo, mas a vida ensinou-me, que só o facto de nos disponibilizarmos para ouvir o anseio alheio, é, muitas vezes, o suficiente para minimizar uma preocupação, desmascarar uma convicção e identificar os reais fatores de desmotivação.

 

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